Emocional

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O vento que surgiu na minha varanda agitou tudo. Tremulou as coisas e arrepiou a alma. Carregou consigo as nuvens e os meus pensamentos. O céu se mostrou mais azul e meus olhos mais castanhos – talvez por ter levado a chuva para além da montanha e as lágrimas para outro lugar.

Ontem, não queria me levantar, um tipo de paralisia emocional. Estiquei as pernas ao máximo. A coluna seguiu meus braços longos e finos numa tentativa inútil de sair daquela posição protetora e infantil.  A fumaça engolida, inflava os meus pulmões e viajava pelas artérias em sonhos e ventania. Segurei na cauda do vento e deixei levar-me para além do halo que cerca meus olhos marrons. Gosto das figuras formadas nesse meu céu inventado. E quando tudo acaba, estou menos pesado e mais flexível. Mas nada disso conta se a pele que estou vestindo não suporta o frio invasor que insiste em visitar-me nas madrugadas embaçadas – volto ao denso líquido amniótico na esperança de libertar-me do imenso emaranhado existente. O sonho me é sagrado somente quando nele você está.

Às vezes, prefiro o sono silencioso, sem personagens e paisagens. Acordar sem a lembrança do ontem. Começar a vida quando os meus pés tocarem o piso de madeira do meu quarto.

Às vezes, prefiro levantar-me sem a certeza de nada. Seguir a vida levado pelo vento. Cobrir-me de nuvens e regar o chão por onde piso.

Às vezes, prefiro continuar no ninho, coberto pelas palhas soltas e protegido da incerteza do mundo. Ando meio cansado de tudo.

Às vezes, acordo querendo sentir o sol.  Olho para o céu na esperança de vê-lo. Mas se o dia está nublado e frio; aqueço meu corpo com uma taça de vinho, e a minha alma com a certeza de um dia melhor.


Hoje, acordei com os olhos brilhando depois de um longo sonho. Seria profano se nele você não estivesse.

Abrigo


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Quando olhei para os seus olhos, os meus encheram-se d’água também. Havia um certo desespero em seu olhar que me deixou aflito por não saber o que fazer; e quando não tenho o que dizer, entrego meu corpo num abraço apertado. E foi o que eu fiz. Enlacei meus braços em seu corpo e, por um bom tempo, ficamos ouvindo os nossos corações. Cada um na sua cadência. Arritmia emocional.

Como era gostoso ser aconchegado por ela. Ficar encaixado até o sono nos transportar pra bem longe da realidade daquele momento. Eram abraços de amor, de vontade de ficar, de querer nunca mais largar. Era como se viajássemos com as asas do outro. Pura leveza.

No meio da aula, no fundo da sala, estavam dois adolescentes num abraço - amigo. Um abraço de consolo, de carinho. Eram cúmplices de algo que a minha mente antiga não alcançava. Enquanto a genética embaralhava as cabeças dos outros participantes do grupo, eles viajavam numa paisagem paralela, entre abraços e carinhos –  quase inalcançável se não fossem os dois corpos materializados no fundo da sala. Pureza, lindeza sem fim.

Quando menino, esperava o meu pai ir para o trabalho e corria para o seu lugar na cama. Ficava como um feto, todo encolhido com os braços de minha mãe protegendo meu corpo franzino. Acho que toda criança gosta de dormir com os seus pais. Não era por medo, era por carinho e proteção - saber que ao lado tem alguém que não vai te fazer mal. Era como se o cordão ainda existisse.

Meu filho quando pequeno gostava de dormir comigo. Usava seu quarto para brincar, estudar e até para tirar uma sonequinha à tarde. Mas na hora de dormir de verdade, nem perguntava se podia ou não, trazia seu cobertor e se instalava num lado da cama. Diferente de mim, sempre achei que tinha medo de ficar sozinho. Só dormia em seu quarto se tivesse companhia.

Talvez por achar o abraço a demonstração mais forte dos afetos, eu a abracei sem dizer uma única palavra. Sabia que naquele momento palavra não bastaria. Dei o calor do meu corpo. Era o que tinha para dar. E depois de um bom tempo ouvindo os nossos corações, o choro veio miúdo, sofrido, abafado pelo meu peito. Nenhuma palavra, somente soluços e suspiros longos.

Com o tempo veio a bonança. Faz parte da ordem natural das coisas. A noite sempre dará lugar ao dia, mesmo que você não queira.

Amanhã quem sabe o meu abraço não terá um outro significado. Mas no momento eu lhe peço: se perceberes que estou triste, abraça-me, abraça-me apertado. Não diga nada, apenas me abraça.