A namorada

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Ela estava ali para ser admirada. Impossível não notá-la. Meus olhos brilhavam ao vê-la debruçada no muro de concreto. Sentia uma imensa vontade de contravir; de tirá-la de cima daquele muro frio e levá-la direto pra casa. Mas o que diria, quando me perguntassem onde a encontrei? Diria que infringi a norma da casa e a roubei do vizinho?  Não, não seria honesto com o vizinho e muito menos com quem me educava.  Então, passei a admirá-la mais de perto. Escalava o muro e a cheirava profundamente. Nunca uma rosa branca fora tão perfumada. O dono da casa e da rosa descobriu-me e acabou virando meu amigo. Contou-me a história da roseira – uma história mais linda que a flor.

Admiro aqueles que conseguem cultivar flores, que as tratam com carinho, doando seu tempo para mantê-las vivas e fortes. Uns dizem que é dom, outros dizem que é técnica. Prefiro dizer que são ambos misturados com amor. Acredito que sejam pessoas apaixonadas pela cor e pelo perfume delas, pessoas pacientes e sonhadoras. Não estou aqui enaltecendo os paisagistas – estes são profissionais. Estou me referindo aos domésticos que fazem o que fazem por hobby, os jardineiros amadores que fazem de um lugar monocromático um lugar perfumado e colorido. Um lugar todo deles.

De repente o terreno baldio ficou coberto por girassóis.  Sempre passava pela rua e reparava aquele lugar jogado, cheio de entulho e mato alto.  Mas alguém teve a delicadeza de limpá-lo e flori-lo com girassóis – os passarinhos agradeceram. O verão ficou mais florido.

Nunca fui bom em plantio. Não pela bobagem de ter ou não ter mão boa para isso. Mas pela falta de paciência, dedicação e técnica. Gosto do imediato, do agora. Não sei esperar.

Ela não estava ali somente para ser admirada. Meus olhos brilharam quando a vi pela primeira vez.  Senti uma imensa vontade de tê-la, de levá-la imediatamente comigo. Mas ela era mais que uma Rosa debruçada num muro de concreto. Levei-a comigo em meu coração. Desejo secretamente aflorado em arrepios e calafrios.  Não por muito tempo. Pois, depois de alguns encontros e desencontros, ficamos juntos fazendo história por uma estação.


Armadilha



Era laço pra enfeitar. Demorei a aprender  fazer o laço no cadarço do sapato. Nunca ficava perfeito.  Andava olhando pra baixo na esperança dele não desmanchar antes de chegar à escola. Certamente me atrasaria por ficar agachado tentando fazer o laço mal feito. Acredite se quiser, mas até hoje eu tenho dificuldade de fazer um laço que dure. Gosto da praticidade e da leveza dos mocassins – bela invenção indígena. Os mocassins não exigem de mim habilidades que não tenho. Sou desajeitado por natureza.  Deixo os laços para quem gosta de fazer arranjo.

Cadê as bolas coloridas que enfeitavam essa árvore? O natal daquele ano foi de laços de fita vermelha. Charmosa, moderna e feminina. Foi demais pra mim. Mas quando não se mora sozinho tem que saber que não se ultrapassa em faixa amarela contínua, principalmente de mão dupla. Nada de colisão por causa de um laço temporário.

Era laço pra brincar.  Os filmes mais concorridos nas salas de cinema eram os de faroeste norte-americanos e os famosos macarrônicos. Ficávamos imitando os caubóis tentando enlaçar um ao outro com pedaços de corda velha. Era divertido quando conseguíamos o feito. Difícil, mas divertido.

Está escrito: laço é nó corredio facilmente desatável com uma, duas ou mais alças. Adorava puxar os laços de cetim que enfeitavam os cabelos das meninas. Há quem faça o laço perfeito. Há quem consiga manter um laço por muito tempo. Têm laços que depois de atados nunca mais se desfazem – são raros, mas existem. Ficam desbotados, amarrotados, perdem o viço, mas continuam ali com suas alças e pontas. Mas também está escrito que laço é armadilha, rede para apanhar caça.  Para muitos é presente, para poucos é fortuna e para outros é prisão.

Quando olhei para os seus pés vi um laço brilhante enfeitando o seu sapato. Era laço pra enfeitar. Ou seria laço pra seduzir?  Sorri um sorriso maroto. Era laço pra enfeitiçar.