Perdidos e achadaos

Raramente encontro o que eu perco, aliás, quase nunca. Não me lembro de ter encontrado algo que tenha perdido. Das seis vezes que perdi a minha carteira, nunca consegui recuperá-la. Eu, em menos de dez meses, num certo ano de minha vida, perdi três vezes os meus documentos. Na época, vivia num mundo estressado, tinha que dá conta de várias coisas ao mesmo tempo: mestrado, pesquisa, trabalho e um relacionamento totalmente conturbado.
Lembro-me de que não tinha céu, não tinha estrelas, não via a lua – estavam perdidos em algum lugar.
Sempre precisava perder algumas coisas para recuperar outras. Nunca acumulei muita coisa.
Com relação aos meus amores, nunca fui capaz de guardá-los com segurança – sempre os perdia fácil. Mas neste caso, sempre ganhava outro.
Hoje já não perco documentos e carteiras, estou mais atento.
Tenho todo um céu pra mim. E os amores...bem...os amores serão sempre perdas e danos e é, certamente, uma outra história.


Paulo Francisco

¨I just call...¨

O som do telefone se confunde com o violão de James Taylor. A casa estava respirando sons dos anos setenta quando o telefone tocou – era ela.

- Pronto! Respondi sonolento. Era fim de tarde e estava descansando depois de um dia puxado de trabalho. Acordei muito cedo e ainda sentia a diferença em meu fuso horário – Todos sabem o quanto me custa acordar cedo.

A voz do outro lado indicava que algo acontecera. Não era comum telefonema àquela hora. Sua voz pequena e curta anunciava tristeza, chuva miúda numa tarde de outono.

Fiquei esperando o seu texto. Mas pra surpresa minha, ela só queria ouvir minha voz.

Verdadeiramente, ela não só queria ouvir a minha voz, ela queria ter certeza de minha existência – segundo ela.

Depois que ela desligou, fiquei pensando como uma voz pode ter o poder de acalmar. Naquele momento James Taylor ainda invadia os cômodos de minha alma.

A voz que mais me acalmava, quando criança, era a voz de minha mãe. A certeza de sua existência, ali pertinho, deixava-me tranqüilo, não tinha medo de fantasmas e nem de ladrão.

No Hospital, a agulha da injeção, ou o estetoscópio frio não me intimidava, porque a voz dela estava ali, me acalmando.

Cresci e a voz da garota da vez era a minha certeza. Hoje, a voz de meu filho é o meu melhor calmante e, a voz de alguns amigos me tira sorrisos.

O som acabou. O silêncio também faz parte de minha vida.

Peguei o telefone e liguei pra ela. A reciprocidade é verdadeira.


Paulo Francisco