Azul



O despertador toca. Só consegue acordar no susto e, aquele som metálico desperta ou assusta, até mesmo, os vizinhos ao lado de seu apartamento. Levanta e vai direto ligar a cafeteira. Não acorda por completo sem um gole de café. Banho tomado, barba feita, roupa escolhida e, em dez minutos estará pronto para mais um dia de trabalho. Abre a cortina do quarto e se depara com um céu límpido, um céu azul sem nenhuma mancha branca. Pensa: ¨Será um dia daqueles. Um dia que dá vontade de desviar o caminho e passar todo ele numa praia calma, tomando água de coco, sem pensar em mais nada. ¨ ¨Mas como? Ainda estamos no meio da semana, tenho que me conformar com o ar condicionado do escritório. ¨ - Completa o seu pensamento.

Entra no carro e parte para uma viagem, se o trânsito permitir, de trinta minutos.

Mas não consegue deixar de pensar na possibilidade de não ir ao escritório naquele dia, ou pelo menos, por aquela manhã. Estranha o seu comportamento, já que não falta nem mesmo quando está doente. Ri sozinho, achando que está ficando maluco.

Ele tem dois trajetos para chegar até o trabalho: seguir pela Serra, caminho curto de trinta minutos, mais ou menos ou ir pela orla, percurso maior, uma viagem de uma hora sem engarrafamento – Fora de cogitação. Está sempre sem tempo.

Sorri, quando pensa na possibilidade de tal travessura. Pronto. Resolve seguir pela orla e, grita sorrindo: ¨ Dane-se!¨ ¨ Dane-se! Sente-se como um adolescente matando aula.

Dirige no mínimo permitido para poder observar, em detalhes, o mar azul riscado por espumas brancas. O céu reflete um azul que só os desocupados, daquele dia, podem usufruir- ¨Que mundo ingrato!¨ - Pensou.
Não querendo filosofar e sim aproveitar a paisagem, estaciona o carro para melhor sentir o ar e o frescor marinho. Caminha em direção ao calçadão. Com o pé apoiado no banco de concreto, admira o mar e, inveja, por alguns segundos, aquelas pessoas deitadas na areia.

Totalmente desalinhado, gravata no bolso da calça, camisa desabotoada, sapatos nas mãos, decide molhar os seus pés naquela água salgada, quando toda aquela imagem some de seus olhos e uma barreira escura lhe cega por alguns segundos. É um lenço que fugiu das mãos de sua dona e foi parar em sua face. Assustado, com a presença repentina daquele objeto leve e perfumado, tira-o imediatamente de seu rosto e ao olhá-lo, pode perceber a delicadeza daquele pano e como é delicada a fragrância exalada por ele.

Olha para o lado de onde vem o vento e vê uma linda mulher andando depressa sobre a areia fofa. Sorrir ao perceber o andar desajeitado dela, querendo andar rápido, mas sem perder o ar feminino no andar.
Ele a ajuda subir o degrau e com um sorriso lhe entrega o lenço. Ela ainda recuperando o fôlego, tenta explicar como o objeto fugiu de suas mãos.

O homem, admirado com a beleza daquela mulher, quase esquece o próprio nome (está tonto diante de tão bela imagem). Após se apresentarem, ele a convida para tomar água de coco no quiosque ao lado. Ela aceita e, ao sentar, amarra o lenço no espaldar da cadeira. Conversam sobre a paisagem, descobrem onde moram, onde trabalham e, depois de uns quinze minutos de conversa agradável, são interrompidos por uma buzina frenética de um carro preto parado próximo aos dois – é o motorista dela. A bela mulher se levanta e se despede rapidamente. Corre para o carro e sem olhar para trás entra no veículo. O motorista – um homem moreno, relativamente jovem, abaixa os óculos escuros com o indicador e mira-o da cabeça aos pés, como se tivesse estudando-o.

O carro sai de maneira brusca, cantando o pneu. Quando ele se volta para o lugar onde ela estava, vê o lenço amarrado a cadeira, tenta tirar rapidamente, pensa em entrar no carro para alcançá-los, mas desiste de tal ação. Pega o delicado lenço, leva-o ao seu rosto e sente o cheiro suave daquele perfume.
Depois de um tempo parado olhando o mar, entra no carro e dirige em direção ao escritório. Chega mais leve, mais bem humorado e, com o lenço azul nas mãos, pede a sua secretaria que entre em contato com a Diretora financeira de uma determinada Empresa.

Ele pensa: ¨ benditos quinze minutos... bendito esquecimento... bendito lenço azul.¨

o telefone toca .

- Alô! Júlia?
- Sim, é ela...
- Carlos, falando... você esqueceu o seu lenço na praia...
- Estou muito distraída...

Sorrisos de ambos.

Os sorrisos continuaram à noite num belo jantar ao lado de um imenso aquário marinho.


Paulo Francisco

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